Ao observar uma garrafa de vinho e entender como aconteceu sua evolução, até chegar ao padrão atual, é possível saber um pouco mais sobre a bebida e sua história.
por Marcelo Copello
Ao admirar uma bela garrafa de vinho: sua cor, formato, capacidade, o material de que é feita, design, rótulo..., podemos não nos dar conta de que um padrão levou séculos para ser alcançado. Desde a Antigüidade, já se sabia que algumas safras eram melhores que as outras, mas apenas com o uso das garrafas de vidro, aliadas às rolhas de cortiça, é que se pode perceber a evolução dos vinhos quando conservados.
Gregos e romanos armazenavam a bebida de seus deuses Dionísio e Baco em vasilhames de couro, barro e cerâmica, mas, para não estragar, ela era misturada a conservantes como a resina de pinho, o que, provavelmente, a tornava intragável para os padrões de hoje. Tanto que, para ser tomado, o vinho era antes diluído em água e temperado com mel e especiarias.
#R#Na Idade Média, o mais comum era conservar o líquido em grandes barris de madeira. Essa prática o mantinha por, no máximo, uns poucos anos, mas apenas até o recipiente ser aberto. A partir desse momento, era necessário consumi-lo rapidamente. Não era possível guardar vinho em casa por longo tempo como se faz atualmente. O comum era que fosse servido diretamente do barril, em cantinas e estalagens. No final do século XVII, a Revolução Industrial trouxe a garrafa de vidro resistente, fabricada em série. Foi um marco na história do vinho. É dessa época o surgimento do champagne, dos grandes Châteaux de Bordeaux e do Porto, um dos primeiros vinhos a ser comercializado em novos recipientes de vidro.
Quanto à sua capacidade, as primeiras garrafas podiam variar muito, chegando a mais de 20 litros. A quantidade de 750 ml, que hoje é um padrão mundialmente aceito, tem sua origem explicada em diversas teorias. A primeira seria em função do tamanho da barrica bordalesa, que, com seus 225 litros, encheria exatamente 300 garrafas. A segunda supõe que 750 ml seria o consumo normal de um casal numa refeição, ou de uma pessoa ao longo de um dia. Uma terceira hipótese é que, como as primeiras garrafas eram sopradas, estes 3/4 de litro equivaleriam à capacidade do pulmão do soprador. Esse volume, contudo, demorou a ser adotado como modelo.
Na Inglaterra, por exemplo, até 1860 vigorou uma lei que proibia a venda de vinho engarrafado. O objetivo era proteger os consumidores de vendedores que poderiam tomar vantagem do formato e capacidade variável dos vasilhames artesanais. O vinho podia ser comprado e depois engarrafado. Muitos compradores levavam suas próprias e já conhecidas garrafas aos locais de compra da bebida.
Quanto à cor, o vidro utilizado normalmente é escuro, para proteger o líquido da luz, prejudicial a seu bom envelhecimento. Algumas regiões seguem convenções, como na Alemanha, onde as garrafas marrons do Reno se diferenciam das verdes do Mosela. Muitos vinhos de bela cor, como a maioria dos rosados, preferem garrafas translúcidas, que valorizam seu aspecto visual. O champagne Cristal, da casa Roederer, teria sido criado em 1877 a pedido do Tsar Alexandre II, que encomendou a bebida em garrafas de cristal puro para que sua linda cor não fosse escondida pelo vidro opaco.
Quanto ao formato, as primeiras garrafas eram abaloadas, com gargalo longo e cônico e com tamanhos maiores, de vários litros. Com o tempo, a forma passou à cilíndrica, de capacidade menor. Esse formato facilitaria o empilhamento, deitadas, ajudando no transporte e envelhecimento.
Hoje, pela forma da embalagem pode-se dizer muito sobre o conteúdo. As mais tradicionais são as garrafas dos tipos: bordeaux (cilíndrica e alta), borgonha (mais baixa e com curvas suaves), alsaciana ou alemã (magra e alongada), champagne (de curvas suaves, de vidro mais grosso e resistente) e de Porto (cilíndricas e baixas). Portanto, pelo formato da garrafa já se pode dizer a região de origem do vinho e, conseqüentemente, algo sobre seu aroma e sabor.
No caso dos produtos do Novo Mundo, o que prevalece é a utilização dos formatos análogos aos Europeus. Por exemplo, em vinhos do Chile, Austrália e Brasil, normalmente, ao se engarrafar um Cabernet Sauvignon ou um Merlot, uvas originárias de Bordeaux, usa-se a garrafa dessa região. Caso seja um Chardonnay ou um Pinot Noir, castas vindas da Borgonha, a preferência será por garrafas iguais as usadas nessa região. Na contra-mão desse fenômeno, alguns viticultores de regiões clássicas como Bordeaux tentam expressar a modernidade de seus produtos em embalagens que desafiam às tradições locais.
Uma dúvida comum: garrafas de fundo com reentrância pronunciada indicam vinhos melhores? Não necessariamente. Essa característica indica apenas maior resistência, além de ajudar no design, proporcionando frascos mais altos e imponentes por causa da aparência de grande tamanho. É comum que um produtor engarrafe seus melhores vinhos, de guarda, em garrafas desse tipo, enquanto venda seus produtos de consumo mais imediato em vasilhames de fundo chato.
(em litros) | garrafas | Bordeaux | Champagne |
0,187 | ¼ | Quart | Quart |
0,375 | ½ | Demi | Demi |
0,750 | 1 | Bouteille | Bouteille |
1,5 | 2 | Magnum | Magnum |
2,25 | 3 | Marie-Jeanne | - |
3 | 4 | Duplo-Magnum | Jéroboam |
4.5 | 6 | Jéroboam | Rehoboam |
6 | 8 | Imperial | Matusalém |
9 | 12 | - | Salmanazar |
12 | 16 | - | Baltazar |
15 | 20 | - | Nabucodonozor |
24 | 32 | - | Salomão |