Vêneto é a maior exportadora de vinhos de seu país, seguindo sua tradição mercantilista e viticultora
por Aguinaldo Záckia Albert
O nordeste da Itália deve menos à tradição e mais ao desenvolvimento moderno que o restante do país. Mesmo assim as origens do vinho ali remontam à antiguidade, quando os etruscos dominavam a região e praticavam a agricultura e o cultivo da vinha, por volta de 600 anos a.C.
Sua história posterior é semelhante a muitas outras regiões italianas: grande desenvolvimento com a dominação romana, quase destruição da atividade vinícola com a invasão dos bárbaros e retomada na era medieval. No Vêneto, esse renascimento se deu ao redor do ano 1.000, sob a proteção da Sereníssima República di Venezia.
Mais perto de nossos dias, a produção de vinhos na região sofreu grande influência austríaca. Hoje, a região é a maior exportadora de vinhos da Itália e promove anualmente a Vinitaly, na cidade de Verona, que divide com a Vinexpo, de Bordeaux, a liderança das feiras mundiais de vinho, seguindo assim a sua longa tradição mercantil.
A propósito, não se pode falar do vinho do Vêneto sem que se ressalte o importante papel desempenhado pela República de Veneza na atividade mercantil européia. Com enormes vantagens naturais, debruçada sobre o Adriático e voltada para o Oriente, desenvolveu um vibrante comércio de mercadorias – e dentre elas o vinho estava em primeiro lugar – por todo o Mediterrâneo, singrado por sua veloz frota de modernos barcos. Traziam para o Ocidente os vinhos da Grécia e também os bons vinhos que o Oriente Médio (Síria, Líbano, Palestina) produzia, sem se importar com o domínio militar muçulmano por esses mares. Tornou-se então a grande potência econômica dessa época, tal era o afluxo de bens e dinheiro que recebia. Durante os séculos XV e XVI, Veneza era o “primeiro grande empório do vinho mediterrâneo”, como nos relata Hugh Johnson em sua obra A História do Vinho.
Vêneto em números Extensão:18.364km2 Área vitivinícola: 70 000 ha Produção: 7.500.000 hl/ano |
Outra grande contribuição veneziana para a vinicultura aconteceu por volta do ano de 1300, quando resgataram a antiga arte romana de fabricar vidros transparentes, que os venezianos buscaram na Síria e implantaram na ilha de Murano. Assim, já no século XVI, apenas os vinhos de excelente qualidade eram guardados em garrafas, prática que toda a Europa imitou.
Localização, Solo e Clima
Verona, Veneza, Vicenza e Padova são as principais cidades do Vêneto. A região vinícola de Veneza faz fronteira ao norte com a Áustria, à nordeste com o Friuli-Venezia Giulia, à noroeste com o Trentino Alto-Ádige, à oeste com a Lombardia e ao sul com a Emilia- Romagna.
Principais sub-regiões vinícolas do Vêneto |
As altitudes variam desde as bem elevadas, próximas aos Alpes, até as planícies que bordejam o mar Adriático, sendo o terreno normalmente ondulado. Muitos lagos, como o de Garda, são encontrados em sua área, além de rios, como o Pó e o Piave, propiciando grande desenvolvimento agrícola. O clima é continental, no interior, e de influência mediterrânea, nas regiões próximas ao mar e ao lago de Garda.
As sub-regiões
Província de Verona e seus vinhos
É sem dúvida a principal zona produtora vêneta, onde vamos encontrar seus vinhos emblemáticos. Engloba as duas principais zonas produtoras: Verona e Teviso. Verona abrange desde o lago de Garda até, rumando para o leste, o vale de Alpone. A produção é bastante grande e nela encontramos exemplos de vinhos de alta qualidade. O Valpolicella e o Amarone della Valpolicella fazem parte da área.
Verona é a capital regional e o lugar ideal para o enófilo se hospedar para fazer suas incursões pelas zonas vizinhas. A cidade em que Romeu e Julieta viveram sua grande história de amor é encantadora, com muitos atrativos turísticos, culturais e gastronômicos. Uma boa dica para o enófilo é beber os melhores vinhos italianos, servidos em taça ou em garrafa, na tradicionalíssima Botega del Vino, no centro histórico, acompanhado de bruschettas, queijos e pratos rápidos. A maioria das pessoas é atendida no balcão. Antes disso, ao cair da tarde, peça um aperitivo ou tome um café em um dos barzinhos da deslumbrante Piazza Bra, tendo à sua frente o anfiteatro romano. Verona fica a poucos quilômetros dos principais vinhedos do Vêneto, como Valpolicella e o Soave.
Outro local que merece ao menos uma visita – ou até mesmo uma hospedagem – é a antiga cidadezinha de Sirmione, à beira do Lago de Garda. Ruínas romanas e medievais, saunas romanas, ótimos restaurantes e muita paz de espírito em um lugar feito sob medida para aqueles que gostam de caminhar a pé. Fica no território do Bardolino Classico.
Fachada da Bottega Vini, point mundial de enófilos, em Verona |
Soave DOC
Apesar do nome, não se trata de um vinho suave (adocicado), mas branco e seco, com discretas notas frutadas, produzido a partir da uva Garganega. A qualidade varia muito, dependendo da zona e do produtor. São três os vinhos classificados: Soave Classico, Soave Classico Superiore (os de melhor qualidade) e o Soave Recioto.
Bardolino DOC
É produzido com as mesmas uvas do Valpolicella (Corvina, Molinara e Rondinella) sendo, no entanto, mais leve. Simplicidade, frescor e boa fruta são suas principais características. A lei permite a adição de até 15% de outras uvas regionais como a Negrara, Sangiovese, Barbera, Rossignola e Garganega. A região de plantio circunda a cidade de Bardolino, à beira do belo lago de Garda, e pode ser de dois tipos: Bardolino Classico, elaborado com uvas oriundas da zona clássica ou histórica, e o Bardolino Classico Superiore, feito também com uvas da zona histórica, mas com teor alcoólico superior a 12,5%.
Outro vinho da região é o Novello, uma versão italiana do Beaujolais Nouveau, elaborado também por maceração carbônica, é um vinho para ser bebido ainda mais jovem do que o Bardolino, assim como seu congênere francês.
Valpolicella DOC
Trata-se de um dos tintos mais conhecidos do mundo, muito exportado. Sua produção é bastante desigual, sendo fundamental que se busque um bom produtor para desfrutar de um bom vinho. Tal fato acontece bastante no Brasil, em que muitos dos que chegam têm baixa qualidade. No entanto, alguns vinhos de bons produtores podem ser ótimos, embora mais caros.
Valpolicella: os vinhos do vale são desiguais, ainda assim, um dos tintos mais conhecidos no mundo |
Extremamente gastronômico, é um vinho que “casa” com vários pratos. Massas, risotos, queijos, pizzas e até carnes (dependendo de sua classificação) vão muito bem com ele. Divide-se em quatro categorias:
• Valpolicella Comum – Produzido a Nordeste de Verona;
• Valpolicella Classico – Produzido a Noroeste de Verona;
• Valpolicella Valpantena – Produzido entre as duas regiões acima;
• Valpolicella Superiore – Com teor alcoólico igual ou superior a 12,5%.
Valpolicella Ripasso DOC
Bem mais encorpado e caro do que os anteriores. É produzido apenas na região de Verona e com uvas secas e bem doces, com alto grau de maturação. A borra desse vinho é adicionada ao Valpolicella normal já fermentado. Devido ao açúcar residual, uma leve fermentação acontece, dando maior riqueza e complexidade ao vinho.
Alguns produtores adicionam ao Valpolicella cerca de 30% de uvas apassitadas (secas e adocicadas), ocasionando assim a segunda fermentação, com ótimos resultados. As condições atmosféricas para se produzir o apassitamento das uvas são muito importantes. Elas devem secar sob um clima seco, frio e com muito vento em galpões secos e ventilados.
#Q#As principais uvas | ||||
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Amarone Della Valpolicella DOC
É, juntamente com o Recioto della Valpolicella DOC, o grande vinho da região. As uvas que entram em sua composição são as mesmas do Valpolicella: Corvina, Molinara e Rondinella, que são colhidas por volta de dez dias antes da colheita normal, de modo a se obter maior acidez e uma casca mais grossa. As uvas serão então apassitadas, ou seja, secas em uma esteira onde são colocadas e abrigadas em galpões secos e ventilados. O ideal é que os dias sejam frios e secos para se obter um bom resultado. Até o final do mês de janeiro, as uvas, desidratadas, perdem até 40% de seu peso. Durante esse período elas podem eventualmente ser atacadas pelo fungo botrytis cinerea, como acontece com os vinhos de Sauternes. Nesse caso, a bebida ganha ainda mais complexidade. Fermentam-se então as uvas, que darão um vinho bastante encorpado, chegando algumas vezes a 16% de álcool.
O Amarone é um vinho seco que deve ter no mínimo 14% de teor alcoólico e ser guardado na cantina por pelo menos dois anos antes de ganhar o mercado. Tem aroma intenso, muito corpo, grande estrutura e um leve traço amargo no final de boca, daí o nome Amarone.
Recioto Della Valpolicella DOC
O nome Recioto deriva de Recie (orelha), pois em sua origem utilizavam-se apenas as uvas localizadas na parte superior externa do cacho, a “orelha”. O processo é igual ao do Amarone até um certo ponto. A diferença é que, durante a fermentação, quando já se conseguiu um bom nível alcoólico (14%), ela é interrompida, de modo a que se conserve um certo grau de açúcar residual no vinho. O Recioto é, então, um vinho adocicado, potente e complexo, elaborado com as mesmas uvas do Amarone.
Província de Vicenza
Nessa província vamos encontrar a cidade de Berganze, rodeada pelas colinas de Berici e Euganei, próxima de Pádua. O solo é bastante variado, apresentando manchas calcárias e vulcânicas, além de depósitos de aluvião próximos aos vales dos rios. As uvas regionais são a Vespaiola, e a Tocai Rosso. Produz-se tintos e brancos, como os Berganze.
Vinitaly, em Verona, divide com a Vinexpo, de Bordeaux, a liderança das feiras mundias de vinhos |
Província de Padova
Região de solo vulcânico, rico em minerais, onde se situam as colinas Euganei (Colli Euganei). É famosa pelos seus vinhos de sobremesa feitos com uvas de colheita tardia, como a Friularo.
Província de Treviso
É a terra natal do Prosecco, espumante muito exportado e conhecido internacionalmente. Integram a região as colinas de Montello, Vittorio Veneto e Asolani, onde se situam suas áreas mais conhecidas: Valdobbiadene e Conigliano. As principais uvas são a Prosecco, a Merlot e a Cabernet Sauvignon.
Província de Venezia
Região plana e próxima ao Adriático. Nessa região de clima marítimo e solo calcário-argiloso são produzidos bons tintos com uvas nativas e francesas.
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