Etiqueta Negra muda filosofia da clássica linha da Concha y Toro
por Guilherme Veloso
O Etiqueta Negra, até hoje o mais ambicioso lançamento da conhecida linha Marques de Casa Concha, da Concha y Toro, marca importante mudança na filosofia que orientou o desenvolvimento dessa linha, calcado em dois pilares: vinhos varietais, ainda que, em alguns casos, outras cepas entrem no blend final; e “single vineyards”, ou seja, provenientes de um único vinhedo. Em sua primeira safra, 2016, o Etiqueta Negra é um corte tipicamente bordalês de Cabernet Sauvignon (60%), Cabernet Franc (32%) e Petit Verdot (8%).
A seu favor, além da qualidade, pode-se dizer que o Etiqueta Negra é uma espécie de volta às origens. As uvas das três castas que o compõem provêm do vinhedo de Puente Alto, nas cercanias de Santiago, o mais famoso da Concha y Toro, que também abastece o Don Melchor, o Almaviva (parceria entre Concha y Toro e Mouton Rothschild) e o Viñedo Chadwick, este da Errázuriz. Assim, mesmo não sendo um “varietal”, ele é a melhor expressão de um terroir de excelência, o Alto Maipo, o mesmo conceito que orienta os demais vinhos da linha.
Não por acaso, o primeiro Marques, lançado em 1976, ainda com o prenome “Reserva Especial” no rótulo, era um 100% Cabernet Sauvignon de Puente Alto, da safra 1972. E talvez não seja coincidência que tenha sido lançado no mesmo ano em que ocorreu o célebre “Julgamento de Paris”. Marcelo Papa, enólogo responsável pela linha Marques desde 1999, hoje também diretor técnico da Concha y Toro, lembra que os anos 1970 foram marcados pela popularização do conceito de vinhos varietais, liderada por produtores como Robert Mondavi e turbinada pelo sucesso dos vinhos norte-americanos no evento parisiense.
O crescimento da linha Marques é quase uma linha do tempo da própria evolução do vinho chileno nos últimos 40 anos, mas também foi influenciado por mudanças no gosto do consumidor e, obviamente, por razões comerciais. Hoje, com a recente adição do Etiqueta Negra e de um Malbec, ela abriga 12 rótulos. Alguns são permanentes e contemplam as principais castas chilenas; outros integram as chamadas edições limitadas. Entre os primeiros, como esperado, figuram, além de Cabernet Sauvignon, Chardonnay, Merlot, Carménère, Syrah e Pinot Noir. No segundo grupo, há, por exemplo, um País/Cinsault, lançado com a safra 2014, que na prática é um varietal, já que a primeira contribui com 85% do corte; e um rosé à base de Cinsault.
Ao criar o Etiqueta Negra, Papa está realizando, pelo menos em parte, o antigo sonho de acrescentar um Cabernet Franc à prestigiosa linha. A qualidade que essa casta alcança nos vinhedos do Maipo é muito alta e Papa contempla essa possibilidade há muitos anos. Mas enfrenta um concorrente de peso internamente. Parte da Cabernet Franc (e também da Petit Verdot, no 2015) se destina a complementar a Cabernet Sauvignon, sempre majoritária no corte do vinho ícone da empresa, o Don Melchor. Afinal, ele homenageia o próprio fundador da empresa, Don Melchor de Santiago Concha y Toro, o sétimo Marques de Casa Concha.
AD 93 pontos
MARQUES DE CASA CONCHA ETIQUETA NEGRA 2016
Concha y Toro, Alto Maipo, Chile (VCT R$ 229). Embora integre a linha Marques de Casa Concha, pode-se dizer que o Etiqueta Negra é um irmão mais moço e abusado do Don Melchor. Em comum, além do celebrado terroir de Puente Alto, que fornece uvas também para o Viñedo Chadwick, o corte de Cabernet Sauvignon/Cabernet Franc e Petit Verdot. A grande diferença entre os dois é que, enquanto o Don Melchor é quase uma expressão da Cabernet Sauvignon, que contribui sempre com mais de 90% do corte, o Etiqueta Negra é um típico corte bordalês: 60% Cabernet Sauvignon, 32% Cabernet Franc, 8% Petit Verdot. O resultado é um vinho rubi escuro, que, mesmo ainda bem jovem, já oferece muita riqueza aromática, com destaque para o característico cassis do Maipo, como ressalta o enólogo da linha, Marcelo Papa, além de notas terrosas, de especiarias, tabaco, embutidos e até uma ponta de grafite. Na boca, potência e elegância convivem de forma harmônica. De um lado, boa acidez, frescor e muita fruta; de outro, uma estrutura tânica ainda bem presente, mas de excelente textura, madeira muito bem dosada (16 meses em barricas de carvalho, mas apenas 60% de primeiro uso) e álcool sem exageros, à altura do conjunto. Por ser um vinho muito saboroso em boca, já dá até para bebê-lo com prazer agora, se acompanhado por carnes de caça (javali) num molho de vinho ou de uma boa picanha. Mas seria uma pena, porque ele ficará ainda melhor num prazo de (pelo menos!) três a cinco anos, quando trocar um pouco da potência atual por mais elegância. Álcool 13,5%. GV
+lidas
Entenda a origem e os princípios da agricultura biodinâmica
Vinho do Porto: qual é a diferença entre Ruby e Tawny?
ProWine 2024 terá masterclass imperdível sobre o futuro dos vinhos no Brasil
1 milhão de garrafas de Brunello di Montalcino falsificadas
É verdade que quanto mais baixa a acidez melhor o azeite?