O Retorno das Salvaguardas – dirigentes da indústria nacional tentam novamente proibir o consumidor de escolher o que quer beber

por Por Christian Burgos

A tentativa de imposição de salvaguardas contra o vinho importado se revelou um dos maiores tiros no pé dados na história do “finado” Ibravin. Lembro como se fosse ontem que naquele momento ter preconceito contra o vinho nacional estava saindo de moda e voltou com força total, de forma agressiva e inclusive com boicotes. Considero que naquele momento, em termos de imagem junto ao consumidor, o vinho brasileiro retrocedeu uma década.

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Ontem tanta gente estava 'retweetando' uma frase e resolvi buscar sua versão original:

“Aqueles que não conseguem lembrar o passado estão condenados a repeti-lo”, disse Jorge Agustín Nicolás Ruiz de Santayana y Borrás, filósofo e ensaísta espanhol que fez fama escrevendo em inglês.

Infelizmente a frase vale para o mercado do vinho na data de hoje. Na verdade, vale mesmo para o dia 20 de maio de 2020. Enquanto muitos amantes do vinho no Brasil estavam postando em suas redes sociais uma campanha para estimular a compra de produtos brasileiros, UVIBRA, AGAVE e FECOVINHO protocolaram uma carta peticionando ao Ministério da Economia aumento de impostos e instauração de barreiras aos vinhos importados.

A carta assinada pelos presidentes das 3 entidades é dirigida ao ministro Paulo Guedes, um amante do livre comércio, o que tornaria o tema cômico se não fosse trágico.

Na carta, as 3 entidades, fundadoras do “finado” IBRAVIN, dizem que a situação econômica que já era ruim para os produtores de vinho nacionais ficou ainda pior com a COVID, com a diminuição do enoturismo (canal de venda de vinhos nas lojas após visita e degustação) e, subretudo, com a importação direta dos supermercados. Após este novo tema quase tudo é requentado, inclusive as demandas.

O vinho importado tem mais de 88% de participação de mercado (consideram apenas vinho fino) e isso afeta 100.000 famílias (espertamente consideram os produtores de uvas e vinhos finos e TAMBÉM de mesa). Por que não usar apenas a participação dos espumantes brasileiros que detém mais de 70% de participação do mercado? No caso de optarmos apenas por sermos honestos e somarmos vinhos finos e de mesa, a indústria nacional tem mais de  69% de participação de mercado, conforme dados da Ideal Consultoria.

Outro argumento é a perda de participação da indústria nacional, que em 1988 era de 66,69% do mercado. Aí preciso de ajuda de outros especialistas, pois pelo que sei naquela data o mercado era fechado à importação. Além disso, neste ano de 2020 o crescimento de vendas de vinhos nacionais é superior ao dos importados.

Também argumentam que o preço médio da caixa de 9L de vinhos importados caiu de USD 27,8 para USD 25,7. Verdade, mas também com dados da Ideal Consultoria, concluímos que, se considerarmos a desvalorização cambial, em reais os preços dos importados subiram 14,1%. A desvalorização cambial é a maior proteção à indústria nacional. A vida dos importadores, como a de tantos outros, já não está fácil.

O que pleiteam com estes argumentos fajutos?

“Mecanismo de controle de importação mediante a aprovação de prévia de licença de importação como forma de criar barreiras não tarifárias para ingresso dos vinhos importados por pelo menos 5 anos”.

Isto é o renascimento das salvaguardas, um burocrata pressionado (ou motivado) decide que já deu licenças de importações demais e estão implementadas as cotas que eram o objetivo das salvaguardas do passado.

“Proibir o ingresso de vinhos e espumantes que não atendem os estritos termos da lei brasileira no que tange aos padrões de identidade e qualidade estabelecidas no Brasil”.

Alegam que o vinho chileno pode ter água adicionada e o brasileiro não, mas na verdade poderão baseados nisso impedir que vinhos considerados reserva, crianza, gran reserva e outras denominações que não são idênticas às brasileiras sejam proibidos. Um cavalo de tróia danado.

Poderia discorrer sobre outros tantos temas da fatídica carta, e em nosso site vamos continuar analisando e esclarecendo. Acima de tudo.

Na tentativa passada de instauração de salvaguardas, vários produtores brasileiros que eram contra dizer por lei dizer o que o consumidor poderia tomar, também foram prejudicados pelo rancor que se abateu contra a categoria. Ontem, já tarde da noite conversei com alguns produtores brasileiros, que se disseram surpresos e contrários a buscar salvaguardas. A frase “um tiro no pé” foi usada por um deles. ADEGA vai dar espaço para esclarecer quais são os produtores que não apoiam este movimento a fim de impedir que sejam prejudicados pelos produtores que pedem salvaguardas ao produto nacional, enquanto andam de carros importados e se vestem com roupas de grifes internacionais.

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