Cientistas simulam infarto em corações de camundongos para os testes
por Arnaldo Grizzo
Um estudo conduzido no Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo descobriu a forma como álcool pode melhorar a saúde cardiovascular. A pesquisa foi publicada na edição de junho de 2018 da revista Cardiovascular Research da European Society of Cardiology.
Dados indicam que a proteção cardiovascular pode estar relacionada com a ativação de uma enzima mitocondrial chamada ALDH2 (aldeído desidrogenase-2), que ajuda a eliminar do organismo tanto os subprodutos tóxicos gerados pelo metabolismo do álcool como também um tipo de molécula reativa produzida nas células cardíacas quando estas sofrem um dano importante – como o causado pelo infarto, por exemplo.
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“Nossos dados sugerem que a exposição moderada ao etanol causa um pequeno estresse nas células do coração, não suficiente para matá-las. Como consequência, ocorre uma reorganização no sinal intracelular e a célula cardíaca acaba criando uma memória bioquímica contra o estresse, também chamada de precondicionamento. Quando a célula é submetida a um estresse maior, já sabe como lidar”, disse Julio Cesar Batista Ferreira, professor do Departamento de Anatomia do ICB-USP.
O trabalho vem sendo feito em parceria com cientistas da Stanford University, nos Estados Unidos. Para estudar os efeitos cardioprotetores do álcool em nível celular, os pesquisadores simularam uma condição semelhante ao infarto em corações de camundongo mantidos vivos em um sistema artificial.
Os cientistas então simulam uma condição clínica conhecida como isquemia e reperfusão interrompendo o fluxo nutritivo para o coração durante 30 minutos. Quando a solução nutritiva volta a correr, o órgão recomeça a bater lentamente e, após uma hora, os pesquisadores conseguem avaliar o tamanho do dano. Em média, nesse modelo, cerca de 50% das células cardíacas morrem caso não seja feito nenhum tipo de intervenção.
Em resposta ao estresse, as células cardíacas começam a produzir grandes quantidades de uma molécula reativa conhecida como 4-HNE (4-hydroxy-2-nonenal), pertencente à classe química dos aldeídos. Em excesso, essa substância tóxica começa a destruir estruturas celulares essenciais. A enzima mitocondrial ALDH2 é a principal responsável por livrar o organismo dos aldeídos acumulados.
“Em nosso estudo, observamos que, no coração exposto ao etanol antes do processo de isquemia e reperfusão, a atividade da ALDH2 se manteve igual à de um órgão que não sofreu injúria. Acreditamos que o estresse causado pelo etanol em dose moderada deixa uma memória e, assim, a célula aprende a manter a enzima ALDH2 mais ativa”, apontou Ferreira. Dessa forma, o grupo que teve a exposição ao etanol, após uma hora, teve uma média de 30% das células do coração mortas, taxa menor que os 50% “convencionais”.
Os pesquisadores também afirmaram que esse efeito não é o mesmo em todas as pessoas, pois depende do DNA. “O acetaldeído resultante do metabolismo do etanol pode ser protetor em pequenas quantidades para a maioria da população, mas também pode maximizar o dano do infarto em um indivíduo com a mutação no gene da ALDH2. Essas pessoas são fáceis de serem identificadas, pois, com apenas um copo de cerveja, ficam com o rosto vermelho, dor de cabeça e não ganham resistência ao álcool com o tempo”, disse Ferreira.
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