A história e as curiosidades do Château Lafite-Rothschild um “Premier Cru” do Pomerol
por Arnaldo Grizzo
Quando o barão Eric de Rothschild (dono do Château Lafite-Rothschild) resolveu comprar a propriedade do Château L’Évangile da família Ducasse, acreditou que seria uma negociação tranquila.
Louis Ducasse havia falecido pouco antes da grandiosa safra de 1982 e, desde então, sua esposa, Simone, estava no comando da propriedade. “Ela era maravilhosa, gostava boa comida e tinha preferência por vodca com casca laranja, que ela bebia como água”, afirmou o barão.
Em 1990, ela assentiu em vender 70% da participação da família em L’Évangile, mas quis manter o controle da propriedade – além de continuar morando no Château. Madame Ducasse, contudo, provou-se uma “verdadeira ditadora”, como recordou o barão. Os Rothschild queriam renovar a propriedade, mas encontraram uma feroz resistência por parte de Simone.
Ela não queria mudanças (dizem que, basicamente, por não concordar com os gastos). Aceitou apenas iniciar a produção de um segundo vinho, o Blasson de L’Évangile, masnão deu consentimento para renovações importantes na adega e nos vinhedos sugeridas por Eric e por Charles Chevalier, então gerente das propriedades de Lafite.
Dessa forma, para poder fazer algumas transformações imprescindíveis, a equipe precisou ser furtiva, como quando quase literalmente jogou barricas novas dentro da adega durante uma noite. “Não conseguimos fazê-la replantar os vinhedos”, contou o barão.
Michel Rolland, consultor do château durante a época dos Ducasse, confirma a casmurrice de Simone Ducasse e chegou a afirmar que vivia discutindo com ela depois que Louis faleceu, não sem antes, em seu leito de morte, pedir a Rolland que cuidasse dos vinhos da propriedade.
O tempo, todavia, fez com que Madame Ducasse fosse se tornando mais maleável. Em 1999, já com mais de 80 anos, ela vendeu o restante de sua participação em L’Évangile, mas continuou a viver no Château até abril de 2000, quando faleceu. O barão se tornou um cogerente e trouxe Dominique Befve (que posteriormente foi para o Château Lascombes). Ele derrubou a antiga e pequena cantina para construir uma nova, maior e mais moderna.
Befve foi substituído por Jean Pascal Vazart (que hoje dá lugar a Eric Kohler, apesar de continuar como assistente de operações) e as transformações continuaram. Por exemplo, os Rothschild passaram a instituir 100% de carvalho novo no envelhecimento de 18 meses do vinho principal, assim como fazer uma seleção cada vez maisrigorosadas parcelas. Vale dizer que hoje o porcentual de barrica nova já está em 70%.
No entanto, não se pode dizer que L’Évangile floresceu apenas após esse período. Ele sempre foi considerado um dos grandes vinhosdo Pomerol, com história riquíssima e enorme consistência, mesmo durante períodos mais conturbados.
Em meados do século XVIII, a família Léglise, de Libourne, fundou a propriedade que se tornaria o Château L'Évangile. Eles estavam diretamente envolvidos nocultivo de vinhas do Pomerol eL’Évangile apareceu pela primeira vez em registo em 1741 com o nome de Fazilleau. Somente na virada do século XIX, quando o foi adquirida por um advogado chamado Isambert é que a propriedade passou a se chamar L’Évangile.
Em 1862, ela foi comprada por Paul Chaperon. E ele foi o responsável por construir sua reputação, além de criar a residência, o Château propriamente, com arquitetura estilo Segundo Império francês.
Na segunda edição do que é considerado um dos primeiros guias de vinho da França,o Cocks& Féret, em 1868, L'Évangilefoi listado como um “Premier Cru duHaut-Pomerol” (lembrando que não existe uma classificação oficial de propriedades na região, assim como a que foi feita no Médoc em 1855).
Em 1900, Chaperon faleceu, e seus descendentes continuaram seu trabalho administrando até 1957. Naquele ano, Louis Ducasse assumiu a propriedade, que estava decadente e havia sido bastante danificada pela geada em 1956. Ele conseguiu replantar o vinhedo erestauraro prestígio de L’Évangile.
O vinhedo de L’Évangile é dividido em 26 parcelas.As vinhas ocupam 22 hectares, compostos de solo argiloso-arenoso com cascalho puro, em um subsolo contendo resíduos de ferro.A essência do vinho está na Merlot, predominante, com cerca de 80% ou mais do corte, completada pela Cabernet Franc, ou “Bouchet”, como a variedade é chamada localmente.
O planalto de Pomerol tem uma longa linha de cascalho na superfície etrês vinhedos, incluindo o de L'Évangile, compartilham esse solo raro. A propriedade ocupa uma posição estratégica, fazendo fronteira com Pétrus e Cheval Blanc (este já em Saint-Émilion), e é, indubitavelmente, um dos grandes châteaux de Bordeaux.
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