As caras da Malbec, Tannat frutado: as novas nuances do vinho sul-americano

por Redação

Um resumo das principais tendências encontradas pelo Descorchados 2019

Gostamos de dizer que, no Descorchados, nosso trabalho é jornalístico, uma espécie de grande reportagem sobre o vinho sul-americano que estamos produzindo há 21 anos. É uma foto em grande angular das tendências e dos movimentos da cena enológica neste lado do mundo, uma cena dinâmica, muito divertida de reportar. Vejamos.

Uma das coisas que mais nos chamou a atenção este ano foi a consolidação de novos projetos em regiões onde até pouco tempo atrás acreditava-se que a viticultura era impossível, sobretudo em lugares chuvosos do sul do continente, e especialmente nos casos da Argentina e Chile.

Na Argentina, criou-se uma pequena comunidade de produtores na Patagônia, mas desta vez muito mais ao sul do tradicional vale de Río Negro, lugar que tem dado vinhos tão bons por décadas. Trata-se de Chubut, nada menos que 1.900 quilômetros ao sul de Mendoza, e onde as vinícolas OtroniaViñasdelNant y Fall ou Casa Yagüe contradizem a ideia de que ali, como esse frio do demônio, é impossível que a uva chegue a uma maturação adequada.

O mesmo ocorre em Osorno, a cerca de 900 quilômetros do vale do Maipo. Em um clima chuvas e frio intensos, Trapidel Bueno, Casa Silva, Miguel Torres, RiberaPellín e Coteaux de Trumao, uma comunidade que luta contra a natureza e obtém vinhos deliciosos.

Delicioso e, acima de tudo, diferentes. As condições naturais de Chubut e Osorno são tão diferentes de outras regiões tradicionais da Argentina e do Chile que se torna evidente que os vinhos também sejam. A acidez é um fator determinante para os descrever: vinhos refrescantes, pulsantes e lineares. E a frutaamadurecida sob esse frio, tem todo o frescor que se possa pedir. Trata-se, com certeza, de um trabalho em desenvolvimento que só tem pouco mais de uma década, ou seja, tempo é o que falta, mas o potencial sobra. É provável que em um futuro próximo, escutemos falar mais e mais de projetos no sul profundo da América do Sul.

Profundidade 

Chubut, uma região a 1.900 quilometros de Mendoza, tem chamado a atenção na Argentina

Mas há outros movimentos que nos têm chamado a atenção. Um deles é o desejo de se aprofundar que se vê no vinho argentino em geral, e em Mendoza particularmente. No Chile, por outro lado, o desejo é mais de ampliar o espectro, de seguir buscando novas fronteiras, buscar novos sabores em novas variedades. Fiquemos de olho.

Graças à imigração, mas também graças à curiosidade dos produtores, o leque de variedades de uvas em Mendoza é amplo. E há bons exemplos de Tempranillo, Bonarda, Cabernet Sauvignon, Garnacha. No entanto, a grande atriz é a Malbec. E aqui começa essa coisa de se aprofundar.

Nada se compara na América do Sul com os estudos que estão sendo feitos com a Malbec em Mendoza, e poucos chegam a esse nível de experimentação. Há 10 anos, só havia uma percepção da cepa, uma definição, uma visão ligada com a suavidade dos taninos ou a doçura de seus sabores. Hoje – e graças a essas experiências, esses estudos – conhecem-se muitas caras da Malbec, e algumas são completamente opostas a essa ideia de tinto suave e amável que nos haviam dito que era. 

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Uruguai

Tannat chama a atenção no Uruguai

No Uruguai também acontece algo parecido, desta vez com a Tannat. Ainda que sem a profundidade de seus colegas argentinos, pouco a pouco os produtores uruguaios buscam uma nova identidade para sua cepa emblemática. A baia de Maldonado, nas costas do Atlântico, hoje é o epicentro dessa revolução de vinhos de vinícolas como Garzón, DeicasBouzaEdén (seu dono é o carioca Mauricio Zlatkin) e Bodega Oceácina José Ignacio. Em todas vê-se a intenção de dar frescor ao Tannat, sem perder sua essência que a estrutura feroz dos taninos. Muito tem a vez com os assessores de algumas delas.

Alberto Antonini na Bodega Garzón e Hans VindingDiers na Oceánica deixaram sua marca. Antonini com Balasto 2016 que é a melhor versão até agora desse tinto e que, além disso, tem 45% de Tannat fresco e frutado. VindingDiers, por sua vez, conseguiu um dos melhores Albariños que provamos na América do Sul e os novos vinhos de Oceánica prometem. Muita atenção essa vinícola e com a baia de Maldonado e seus vinhos cheios de fruta e frescor.

Brasil

No Brasil, a Campanha Gaúcha vem se destacando no que tange aos tintos

E, para terminar esse curto resumo, Brasil. Temos falado do entusiasmo que nos provoca a nova onda dos espumantes brasileiros, cada vez melhores, cada vez mais focados na elegância do método tradicional e, além disso, dando espaço para novos estilos como o “cru” (sem eliminar leveduras) que é já quase uma categoria entre os vinhos brasileiros. Consistência é uma palavra que começa a soar entre as borbulhas do Brasil. Outra coisa são os vinhos tranquilos.

E o que temos visto nos agrada. Há já três edições de Descorchados que provamos vinhos tranquilos brasileiros. E sim, temos visto uma evolução nisso que para nós é essencial e que se resume em “capturar a fruta”. Antes de encontrar um estilo, seja qual for, muito antes de buscar o senso de lugar, está o desafio de capturar esses sabores varietais em seu ponto de maturação. Nem antes para um vinho verde, nem depois para que o vinho perca toda a personalidade e se converta em uma geleia.

Exemplos neste ano há muitos. Miolo, por exemplo, a gigante do Brasil que gerencia um estilo opulento, mas às vezes equilibrado em vinhos que obtém de seus vinhedos plantados na primeira metade da década passada, sobre solos arenosos da Campanha Gaúcha, quase na fronteira com o Uruguai. Dali este ano provamos o Quinta do Seival Castas Portuguesas 2018 e o Single Vineyard Touriga Nacional 2018, ambos vinhos amplos, redondos que enchem a boca.

Dessa mesma região vem o melhor tinto deste ano no Descorchados. E como se a fronteira com o Uruguai estivesse chamando, trata-se do Tannat Rastros do Pampa 2018 da vinícola Guatambu, no município de Dom Pedrito. Suportado por Alejandro Cardozo, este Tannat se distancia do estilo suculento da Miolo e oferece uma cara mais próxima da nova onda de Tannats frescos e tentos que o Uruguai oferece hoje.

Nos tintos, também pode-se buscar fruta na Luiz Argenta, Leone di Venezia ou também nos tintos do sempre experimental (e um pouco maluco) Rogério Gomes da Quinta da Figueira. Há fruta ali, há intenção nesses tintos.

A América do Sul se movimenta, há notícia suficiente para uma boa reportagem como quisemos fazer este ano em Descorchados, mas sobretudo há bons vinhos para que vocês provem.

O que você já pode provar agora:

- Amancaya Reserva 2016

Tinto composto de 70% Malbec e 30% Cabernet Sauvignon, com estágio de 50% do vinho durante 12 meses em barricas de carvalho francês. Fluido e gostoso de beber, mostra notas florais, de ervas e de especiarias doces envolvendo toda sua fruta lembrando ameixas. Tem taninos de ótima textura, refrescante acidez e final persistente, confirmando o nariz. Muito preciso e balanceado. Álcool 13%. Compre aqui.

- Kalfu Sumpai Pinot Noir 2016

Tinto elaborado exclusivamente a partir de uvas Pinot Noir, com utilização de 30% de engaços durante a fermentação e estágio de 10 meses em barricas de carvalho francês da Borgonha, sendo 30% novas. Cativante, mostras aromas de morangos acompanhados de notas florais e terrosas. Elegante e equilibrado, destaca-se pelo caráter mineral. Experiência incrível é acompanhá-lo de sashimi de atum com foie gras. Álcool 13,5%. Compre aqui.

- Pizzorno Tannat Maceración Carbónica 2018

Tinto elaborado exclusivamente a partir de uvas Tannat vinificadas por maceração carbônica e sem passagem por madeira. Uma deliciosa e refrescante interpretação da Tannat, que privilegia a fruta fresca, a acidez vibrante e os taninos macios, mas cheios de textura. Um vinho para ser bebido quase gelado, que, por ser fácil de entender e muito gostoso de beber, parece menos complexo do que realmente é. Perfeito exemplo de que, as vezes, menos é mais. Nesse caso, muito mais. Álcool 13,5%. Compre aqui.

- Intenso Marselan 2017

Tinto elaborado exclusivamente a partir de uvas Marselan cultivadas na Campanha Gaúcha, sem passagem por madeira. Aqui menos é muito mais. Puro suco de frutas, esbanja amoras e ameixas frescas acompanhadas de notas florais, terrosas e de ervas. Suculento e gostoso de beber, tem ótima acidez, taninos macios e de boa textura e final médio e agradável, confirmando o nariz. Para os embutidos. Álcool 13%. Compre aqui.

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