Qual origem da fragrância de framboesa, banana, baunilha ou caramelo?
por Euclides Penedo Borges

Branco, tinto ou rosado, o vinho é certamente a bebida alcoólica que mais se destaca pela fineza e complexidade de seus aromas.
Provenientes da uva, da fermentação ou da guarda, eles refletem na mucosa olfativa do degustador a presença de centenas de compostos aromáticos que a bebida armazena, em quantidades vestigiais.
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Alguns deles são mais frequentes ou mais pronunciados e cercam-se de curiosidades quanto à sua origem. Abaixo, alguns deles.

A framboeseira é um arbusto da família das rosáceas que surge em estado silvestre nas matas do hemisfério norte. Rara no Brasil, pode ser encontrada em São Paulo, nas redondezas de Campos do Jordão, e esparsamente em estados sulinos.
Seu fruto vermelho, escuro e corrugado - a framboesa - é rico em pectinas, próprio, portanto, para geleias. Não sendo uma fruta comum entre nós, reconhecemos sua presença pelo odor das geleias ou licores produzidos a partir dela.
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Trata-se de uma fruta conhecida e consumida no continente europeu desde tempos imemoriais, o que pode ser confirmado por seu nome botânico "rubus idaeus", isto é, o "arbusto do Monte Ida", referência à existência da planta na montanha de Creta, onde Zeus teria nascido, se é que os deuses nascem...
O aroma de framboesa no vinho, perceptível em grande número de tintos, deve-se à presença da frambinona - nome comum da fenilbutanona - substância com odor de framboesa que se forma durante a fermentação.
Tendo efetuado um levantamento em cerca de duzentos vinhos diferentes, posso afirmar que o aroma de framboesa é o mais frequente nos tintos.
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Se você não se deu conta disso, sugiro procurá-lo em sua próxima degustação de Cabernet, Syrah, Nebbiolo e Tempranillo europeus, ou de Malbec, Tannat, Carmenère e Zinfandel do Novo Mundo. Faça isso após provar várias vezes a geleia da frutinha para memorizar seu gosto.

Colheita em setembro, vinificação em outubro, engarrafamento no início de novembro. E pronto. Na segunda quinzena de novembro, "le Beaujolais Nouveau est arrivé", com estrondoso sucesso de vendas, em todo o mundo.
O que há de especial em sua elaboração que resulta no indefectível odor de banana, cuja intensidade varia ano a ano?
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Na vinificação do Beaujolais acomodam-se bagos inteiros de uvas Gamay em cubas fechadas, sob pressão. Nessas condições, as enzimas da polpa são ativadas, verificando-se no interior do bago uma tímida transformação de açúcar em álcool, com formação interna de gás carbônico.
A fermentação intracelular cessa naturalmente após uns dez dias com a asfixia das células da polpa e é a chave de ignição do processo de elaboração do Beaujolais, conhecido como maceração carbônica. Diminui-se o teor de ácido málico e formam-se álcool, glicerina e outros componentes. Entre eles, o acetato de isoamila com seu cheiro de banana amassada.
Com o esfacelamento dos bagos por pressão e pelo peso das camadas acima, as leveduras passam a agir, obtendo-se - se me permitem a rima - um tinto brilhante, frutado e leve, de pouca estrutura e vida breve.
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E o aroma de banana estará no Nouveau, para nossa alegria, mais ou menos intenso, dependendo da concentração de acetato de isoamila naquele ano, para cada produtor.
Esses dois odores agradáveis desenvolvem-se nos tintos e brancos a partir da mesma substância, a vanilina da madeira, sendo, portanto, aromas de vinhos fermentados em tonéis ou amadurecidos em barricas.
A baunilha é nítida nos brancos barricados da Chardonnay, particularmente nos da Califórnia, do Chile e da Austrália, nos tintos de corte bordalês ou nos Reserva e Gran Reserva da Rioja.
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Nos grandes vinhos de Bordeaux, a nuance discreta de sorvete de creme se deve à simbiose da Cabernet Sauvignon e da Merlot com o carvalho francês. O que se percebe é a nuança menos intensa, porém mais suave e refinada, do vanilato de etila, resultante da esterificação da vanilina.
A vinificação especial dos vinhos doces naturais - Banyuls, Maury, moscatéis de Setúbal e Pantelleria etc. - lhes comunica um odor caramelado.
Quem se habituou à degustação cuidadosa de vinhos barricados sabe a dificuldade em se decidir entre os aromas de baunilha e caramelo. Como esse último nada mais é que açúcar queimado, sugiro que se procure um toque tostado. Com tostado é caramelo, sem tostado é baunilha.
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