Típica de Portugal, a Touriga Nacional é uma uva tinta que produz alguns dos principais vinhos lusitanos
por Sílvia Mascella Rosa
No pequeno território português, que é pouco maior do que o estado de Santa Catarina, existem 230 tipos de uvas e a grande maioria delas é natural de lá, ou seja, desenvolveram-se há centenas de anos nesse recanto especial da Península Ibérica.
Essas uvas, que são típicas de um local e de difícil adaptação em outros terroirs, são conhecidas como “uvas autóctones” e uma das principais tintas portuguesas que se encaixam nessa categoria é a Touriga Nacional.
Leia mais:
+ A origem dos vinhos portugueses
+ Avaliação de vinhos Touriga Nacional
Sua baixa produtividade natural quase lhe custou a sobrevivência no território quando uma praga chamada filoxera arrasou com as plantações europeias em meados do século XIX. Nesse momento, muitos produtores portugueses decidiram replantar seus vinhedos com variedades que produzissem mais. Felizmente para a vitivinicultura mundial, a Touriga Nacional sobreviveu em regiões como o Douro e o Dão e, em tempos de moderna vitivinicultura, já na segunda metade do século XX, ganhou novo vigor, com os enólogos e agrônomos tendo maior entendimento de suas características e trabalhando para, pouco a pouco, melhorar sua produtividade sem descaracterizála. Assim, de coadjuvante em muitos vinhos (é uma das castas na composição do Vinho do Porto), ela aparece também em varietais modernos e saborosos, de grande elegância.
Pouco se sabe sobre as origens da Touriga Nacional e os estudiosos no assunto tendem a aceitar que ela é original das mesmas regiões onde segue sendo cultivada, o Douro e o Dão, na região norte de Portugal. Um dos nomes pelos quais ela também é conhecida é Preto de Mortágua, nome de uma pequena e antiga vila na zona do Dão. Isso combinado com o fato de outro vilarejo da região ser chamado de Tourigo reforça a ideia de que essa casta existe por lá há muitos séculos.
O que os cientistas são capazes de comprovar com maior facilidade é que dela são derivadas as variedades conhecidas como Touriga Fina e Touriga Macho. No entanto, seu parentesco com a Touriga Franca (conhecida como Touriga Francesa até a virada deste século) é impreciso. Não se sabe se a Franca é uma subvariedade (ou mutação) da Nacional ou uma combinação da Nacional com outra uva.
Como que para compensar sua baixa produtividade, a planta é bastante resistente aos fungos que preocupam viticultores em áreas com muitos microclimas, como a do Douro. Seus pequeninos e negros grãos são muito concentrados em açúcar quando bem maduros, em matéria corante, ácidos e têm uma boa carga de taninos.
Já os vinhos produzidos com esses grãos resultam muito escuros e com aromas bastante poderosos (antigamente, mesmo no Dão, a maioria dos vinhos feitos com a Touriga Nacional era quase sutil em aromas, mas isso mudou nos últimos tempos entre os bons produtores), com estrutura capaz de suportar a passagem em madeira e sobreviver ao tempo. Quando bem feitos, os vinhos varietais da Touriga Nacional são repletos de aromas de frutas negras, quase em calda e com um toque floral bastante diferenciado – de violetas, por vezes. Em algumas versões, o vinho resultante tem sabores concentrados e frutados, embora em boca seja de boa acidez, taninos elevados e um toque (que pode ou não ser sutil) de especiarias.
A qualidade da moderna Touriga Nacional vem sendo reconhecida também em seu país de origem, e vinhedos da casta vão surgindo em outras regiões, como Alentejo e Estremadura, não apenas para cortes, mas também para varietais de alta qualidade. Com isso, a uva ultrapassou fronteiras e, nas últimas décadas, tem sido cultivada em pequena escala em países do Novo Mundo, como Austrália, Estados Unidos e também no Brasil, onde há vinhos feitos com ela em três diferentes regiões, no Nordeste, na Serra e na Campanha Gaúcha.