Denominação Gevrey-Chambertin é a que possui mais vinhedos Grand Cru na Borgonha
por Arnaldo Grizzo
Quinze quilômetros ao sul de Dijon, a vila de Gevrey-Chambertin, incrustada no combe (vale) de Lavaux, com pouco mais de 3 mil habitantes, é o centro da denominação borgonhesa que mais vinhedos Grand Cru possui.
Ao todo são nove dos 33 Grand Cru classificados na região em um total de 408,44 hectares e uma produção média de 1.700.000 litros de vinho. Seus vinhos são considerados os mais encorpados, intensos, estruturados e potentes entre os tintos de toda a Borgonha.
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A história da vila remonta ao ano de 640, quando foi registrada como Gabriacus e pertencia aos abades de Bèze. Os monges foram responsáveis por desbravar as plantações de vinha originais. Em 1257, o abade de Cluny decidiu que precisava de fortificações e iniciou a construção de um castelo, cujos vestígios ainda podem ser vistos no alto do vilarejo.
Por volta de meados do século XVI, contudo, uma praga infestou suas vinhas e comprometeu a viticultura por mais de um século. Foi somente em 1847 que um decreto real concedeu à comuna o direito de adicionar o nome de seu Grand Cru mais famoso à sua designação; nascendo assim Gevrey-Chambertin.
Os vinhedos de Gevrey se estendem por mais de 400 hectares; sendo que seus 9 Grands Crus correspondem a mais de 90 ha. Há ainda 26 Premiers Crus com 80 ha e a denominação de Village, incluindo 11 climats da vila de Brochon – que tem direito de chamar seu vinho de Gevrey-Chambertin – com os restantes. Seus vinhos são apenas tintos, feitos, obviamente, com Pinot Noir.
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A principal influência no terroir da vila é o Combe de Lavaux, um vale íngreme que, funciona como um funil, muitas vezes atraindo mau tempo, especialmente no que tange o granizo. Felizmente, a parte mais alta não enfrenta geadas, que, geralmente afeta as áreas mais planas perto da estrada principal. O clima mais fresco das encostas superiores costuma retardar o processo de maturação das uvas.
Entre 280 e 380 metros acima do nível do mar, os Premiers Crus ocupam a parte superior da colina, onde predominam solos calcários levemente castanhos, logo abaixo a denominação Village se desdobra também sobre solos calcários castanhos. As vinhas se beneficiam de margas cobertas de seixos e lodo vermelho do planalto. Estes cascalhos dão ao vinho elegância e finesse, enquanto as margas ricas em conchas fósseis e argilosas sugerem mais corpo e firmeza. Há exposições solares a leste e sudeste. Os Grands Crus estão situados ao sul da vila em uma faixa de encosta voltada para o leste, levemente inclinada a uma altura entre 260 e 320 metros, protegida do vento frio pela floresta acima.
Gevrey possui um terroir de grande diversidade. Os Grands Crus são plantados em uma base de calcário compactado. Os solos superficiais são relativamente ricos em argila, com menos concentração em Griotte e Chapelle-Chambertin, e mais em Mazoyères, um solo mais fecundo, com um afloramento de 30-35 cm de cascalho bem drenado. Os dois mais famosos Grand Cru, contudo, Chambertin e seu vizinho, Clos de Bèze, têm bastante influência da floresta – que protege as vinhas mais ao norte dos ventos e geadas, assim como dos combes Grisard e Lavaux, com solos bastante finos de pedras calcárias. Latricières-Chambertin e Ruchottes Chambertin estão em terreno mais alto, com um solo de marga branca; e o alto teor de calcário tende a dar aos vinhos mais estrutura e dureza de taninos.
Em outras partes da comuna, as profundidades do solo variam; os solos superficiais são frequentemente finos com afloramentos rochosos claramente visíveis. Os terrenos planos de ambos os lados da estrada, onde se concentram as denominações Village e regionais, têm solos mais profundos e ricos, dando amplitude e corpo, mas menos requinte.
Há, no entanto, mais complexidade no solo aqui do que em outros lugares na colina como resultado dos detritos rochosos depositados pelo Combe de Lavaux ao longo dos tempos. Esta é uma das razoes pela qual a denominação se estende mais para a planície em Gevrey do que em Chambolle ou Vosne.
Em 1860, o comitê de Beaune classificou Chambertin e Clos de Bèze como “primeira classe”, acima de todos os outros Crus. Idiossincrasias administrativas, porém, permitem que o vinho de Clos de Bèze seja rotulado como Chambertin, mas não vice-versa. Assim como o vinho de Mazoyères-Chambertin seja chamado de Charmes-Chambertin, mas não o contrário.
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Entre os Premier Cru, há alguns de grande destaque como Aux Combottes e Clos Saint-Jacques. Aux Combottes, na divisa com Morey Saint-Denis, é um “aspirante” a Grand Cru. Os vinhateiros de Morey “sugerem” que ele nunca se tornou um Grand Cru porque ninguém de Gevrey estava interessado – todos os proprietários eram de Morey. O vinhedo murado de Saint-Jaques também é um primus inter pares dos Premier Cru da Borgonha, tratado como um Grand Cru por seus proprietários.
Existem ainda 69 nomes de climat em potencial que podem aparecer em um rótulo dos Village de Gevrey. Nenhuma outra denominação tem tantos Village classificados – Meursault chega perto com 305 hectares, mas Gevrey tem quase 360, 310 dos quais em Gevrey mais outros 50 em Brochon. Por ser uma área tão grande, os vinhos de Gevrey também podem variar bastante. As cuvées mais interessantes, geralmente, são as feitas com vinhas mais próximas aos Grand Cru, sendo que alguns são separados dos vinhedos mais famosos apenas por muros ou estradas simples.
O folclore local diz que este foi um campo de um homem chamado Bertin. Dado o sucesso dos monges de Bèze, ele os copiou. O campo (Champ) de Bertin tornou-se Chambertin. A vinha é encimada por um bosque, o que atrasa a maturidade.
Há mais inclinação no topo, mas de cima para baixo a diferença é de apenas 20 metros. Existem mais de 20 proprietários em Chambertin. Seus vinhos são considerados bastante densos e musculosos, a epitome desse estilo mais potente na Borgonha. Junto com Clos de Bèze, é considerado o melhor Grand Cru de Gevrey-Chambertin.
Fundado pelos monges de Bèze no século VII, Clos de Bèze é um dos vinhedos mais antigos da Borgonha e o mais antigo dos dois Chambertins. O vinho deste vinhedo pode ser chamado de Chambertin ou Chambertin Clos de Bèze. Diz-se que o clos foi cercado por um muro – não muito diferente do Clos de Vougeot – mas poucas evidências disso permanecem.
A encosta está exposta um pouco mais a leste do que a de Chambertin, e esse sol aliado à falta da brisa fria de Combe de Grisard ajuda a amadurecer mais cedo. Toda a encosta fica em um leito profundo de calcário, embora o solo seja de cor mais clara, e com mais profundidade no topo do vinhedo. Existem cerca de 18 proprietários. Curiosamente, as parcelas tendem a ser escalonadas ao longo da encosta, cada uma com uma seção transversal de videiras altas e baixas. Embora Clos de Bèze seja quase três hectares maior que Chambertin, sua produção média anual é menor.
Chapelle-Chambertin aparentemente leva o nome de uma pequena capela que ficava no local, Notre Dame de Bèze, demolida por volta dos anos 1830. O vinhedo fica logo abaixo da porção central de Clos de Bèze e ao lado de Griotte-Chambertin.
Chapelle é composto por duas áreas, Chapelle ao sul e Gémeux ao norte, que faz fronteira com os Premier Cru de Cherbaudes e Champitenois. A característica mais notável da vinha é que o solo é um pouco mais profundo que o de seu vizinho Griotte. Chapelle-Chambertin, apesar de três vezes maior que Griotte, é muito menos conhecido.
Com mais de 30 hectares, esta denominação representa uma área significativa de vinhedos Grand Cru, e grande parte dessa terra também está bem situada abaixo de Chambertin. Ambas as seções de Charmes e Mazoyères desfrutam de excelente orientação ao sol e evitam os ventos frios de Chambertin acima. Existem mais de 40 proprietários.
Por mais de um século e meio, os produtores de Mazoyères-Chambertin foram autorizados a rotular seus vinhos como Charmes-Chambertin (mas não vice-versa). Hoje, a distinção quase chegou ao ponto de haver muito poucos Mazoyères encontrados. Portanto, faz sentido considerar os vinhedos como um. A origem do nome Charmes vem de uma corruptela da antiga palavra francesa chaumer/ chaumée que significa limpar um campo de restolho e denota um pedaço de terra abandonado que é posteriormente replantado. A origem de Mazoyères é obscura, mas supõe-se que possa vir de maison (habitações).
Situado abaixo do Clos de Bèze, ele evita as brisas frescas acima, é um local bastante quente, com uvas sempre colhidas antes de Chambertin. Griotte-Chambertin é o menor dos Grands Crus de Gevrey. O seu tamanho e a consequente pequena produção fazem com que seja raramente encontrado. Existem dois relatos populares para o nome deste vinhedo. Diz-se que o calor do verão captado pela forma côncava do climat, amplificado pelos afloramentos rochosos, faz parecer uma pequena grelha ou grillotte. A segunda atribui o nome ao aroma de cereja (griotte, em francês) que muitos teoricamente encontram no vinho.
Mas crê-se que o nome deriva da antiga palavra francesa ruotte que significa ruisseau (pequeno riacho), provável referência a um riacho subterrâneo que flui entre Chambertin e Clos de Bèze em Griotte e emerge como um par de fontes de água, ou ainda que derive do tipo de solo predominantemente calcário que os franceses chamam de criotte ou crai.
Latricières é o Grand Cru de Gevrey mais ao meridional, vizinho do Grand Cru de Morey de St. Denis, o Clos de la Roche, ao sul, e ao norte de Chambertin.
A brisa fresca que afeta Chambertin chega primeiro em Latricières, portanto, este é o climat mais fresco dos Grand Crus. Tricières deriva de uma palavra latina que significa terra estéril e aqui o solo é muito fino.
Mazis ou Mazy, ou ainda Mazi, como às vezes é chamado, é dividido em uma parte superior e outra inferior, ambas vizinhas ao norte de Clos de Bèze. Sugere-se que o nome Mazis veio da palavra “mas”, que mais tarde se tornou “maison” (casa) e pode se referir a um grupo de casas substituídas por vinhas no final do século XIV.
Outra possibilidade é o nome vir de “mazurs”, ou ruinas. E ainda há a hipótese de Mazis significar aldeia. Existem cerca de 20 proprietários nesta vinha, sendo o Hospices de Beaune o maior.
O Grand Cru mais ao norte, perto da saída do combe (vale) de Lavaux. É também o mais íngreme, por isso, mantém muitos muros antigos para proteger o melhor possível contra a erosão – apesar disso, o solo é muito fino. Como Mazis, é dividido em uma seção superior e inferior – a parte superior é um clos e monopólio do Domaine Armand Rousseau, o Clos des Ruchottes.
Especula-se que havia uma espécie de apiário aqui, e o nome venha da palavra “ruche” que significa colmeia. Mas é mais provável que derive de “rochers”, que significa rochas.
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