O álcool e acidez são elementos chave do vinho de qualidade
por João Afonso
Desde que há memória de vinho o homem sempre lutou por colher uvas maduras. Claro que o conceito de "maduro" varia conforme a mentalidade do lavrador e respectiva região mas em termos sensatos, e excluindo os casos especiais, a uva está madura quando o seu potencial alcoólico (graduação alcoólica pós fermentação) se situa entre os 11% e os 13% vol (embora o conceito, conforme o tipo de vinho, possa ser alargado para de 9 a 15%).
Nos países temperados, tradicionais produtores de vinho, à medida que subimos em latitude estes números podem tornar-se autênticas quimeras para o lavrador comum. Pelo contrário, nos países ou regiões meridionais estas graduações são normalmente fáceis de atingir. É na hora da vindima que tudo se decide. Na Europa, a quantidade de sol nos meses de Agosto e Setembro são fundamentais para o agricultor colher uvas suficientemente maduras.
LEIA TAMBÉM: Quanto mais álcool, melhor o vinho?
E o acompanhamento periódico da maturação das uvas com base na curva ascendente dos açúcares e curva descendente dos ácidos é o mínimo que se pede a qualquer viticultor consciencioso. Porém, na verdade, a maioria dos vitivinicultores presta maior atenção aos açúcares ou potencial alcoólico do que a qualquer outra medida.
Por duas razões principais: o vinho agradece mais uma correcção ácida do que uma correção de açúcares e no caso dos vinhos tintos a quantidade de cor aumenta com a maturação... Além da cor também não podemos esquecer os taninos. Com a maturação correcta perdem o carácter verde e agressivo e ganham macieza e voluptuosidade. Por tudo isto uvas maduras são a "razão de viver" do viticultor.
O álcool no vinho surge com a fermentação dos açúcares (glicose e frutose) feita por um grande número de leveduras (uma gota de mosto em plena fermentação pode conter 5 milhões de leveduras).
LEIA TAMBÉM: Campanhas contra o consumo de álcool ameaçam o mercado de vinhos
Esta fermentação tem o nome de "alcoólica" porque degrada os açúcares em álcool e dióxido de carbono. Estes açúcares provêm da fotossíntese foliar e de reservas existentes na madeira da própria cepa. Aqui se compreende a importância de uma vinha velha (bem tratada) na consistência e qualidade das vindimas que produz.
São inúmeros os fatores que influenciam a graduação alcoólica de um dado vinho. Estes factores podem dividir-se entre aqueles ligados à vinha tais como a latitude, altitude, exposição e condução da vinha, condições climatéricas durante a vindima, porta enxertos, castas, índice de produção, poda e fertilização; e aqueles inerentes às técnicas enológicas tais como açúcar residual, chaptalização, concentração e fortificação.
Todavia, de um modo simplista e genérico, o clima é o grande determinante do grau alcoólico no vinho e consequentemente do seu equilíbrio. Em algumas regiões européias, nomeadamente as de influência mediterrânica, com Verões excessivamente quentes e maturações rápidas, as uvas apertadas pelo calor sintetizam grandes quantidades de açúcar mas perdem uma boa parte do seus ácidos, o que significa, que uma boa fatia destes vinhos necessita correção de mosto antes de iniciar a fermentação. Noutras regiões, mais a norte, as uvas não perdem a acidez mas também não conseguem atingir níveis de álcool elevados.
LEIA TAMBÉM: Estudo diz que vinho sem álcool “tem os mesmos benefícios para a saúde do coração”
Uma forma de contornar o problema é fazer vinhos meio secos como o caso dos célebres brancos alemães.
A seguir à água (85 a 90% do volume do vinho) o etanol (álcool mais comum da fermentação) é o principal elemento do vinho. Ele é o suporte técnico de todos os aromas e sabores do vinho.
O etanol tem um gosto doce e tal como todos os elementos de sabor doce dão uma textura macia ao vinho. Os taninos, por seu lado, com um gosto amargo dão uma textura rugosa ao vinho e os ácidos, obviamente com um gosto ácido, dão nervosidade ao vinho podendo aumentar a sua aspereza e amargor.
LEIA TAMBÉM: Conheça os vinhos do estado de Washington
Os vinhos mais ásperos são aqueles ricos em taninos e ácidos e com uma graduação alcoólica relativamente baixa. Com uma graduação alcoólica elevada um vinho suporta mais acidez e com um pouco menos acidez suporta mais taninos.
Para muitos, o aspecto mais importante na degustação de um vinho é a sua suavidade e esta é dada em boa parte pela graduação alcoólica. É ela que equilibra e suplanta o teor de ácidos e taninos. Dentro de parâmetros sensatos quanto maior for a graduação de um vinho maior serão as suas possibilidades de conquistar o palato do provador.
Já alguma vez imaginou beber um vinho sem álcool? Eu não! O álcool é a alma do vinho. É a sua maior ou menor presença que define muitas das vezes a sua qualidade. É habitual dizer-se de um vinho com mais de 13% de álcool que é encorpado, vinoso, capitoso, quente ou mesmo, e porque não, aconchegante, tal como uma lareira acesa numa noite de Inverno.
LEIA TAMBÉM: Vinícolas brasileiras e estrangeiras ainda podem se inscrever no Brazil Wine Challenge
Do mesmo modo, no campo oposto, e exceptuando casos especiais, um vinho seco com menos de 11% de álcool é um vinho leve, magro, ligeiro e quase sempre desinteressante. Mas é também verdade que o álcool em excesso pode tornar um vinho pesado, chato, mole, desinteressante.
O álcool é também o elemento social do vinho. Devido à sua influência sobre o sistema nervoso humano, permite, quando bebido com moderação, um estado físico e intelectual que favorece os encontros sociais e as conversas entre amigos.
É muitas das vezes, ele mesmo, um excelente motivo de conversa quando a sua qualidade ou exotismo atrai a atenção de quem o degusta. Tomado com as refeições tem também um efeito tónico sobre a digestão favorecendo a sua conclusão.
LEIA TAMBÉM: Interbev Wine Tasting realiza sua terceira edição em São Paulo
O álcool tem também implicações na saúde pública. Implicações que podem ser positivas ou negativas. Como elemento tóxico quando consumido em excesso (em vinho ou outras bebidas alcoólicas) conduz a transtornos mais ou menos graves do sistema nervoso e vegetativo (a comum bebedeira) que tantas dores de cabeça têm causado à humanidade desde que nos conhecemos como tal.
Mas se tomado regularmente e em quantidades sensatas protege o consumidor de ataques cardíacos ou acidentes vasculares cerebrais porque diminui a ocorrência da formação de coágulos no sangue. Tal como o açúcar das uvas é a razão de viver do viticultor, o álcool é sem dúvida alguma a razão de ser do vinho. Sem álcool não haveria vinho.
Alguns vinhos parecem-nos muito ácidos, transmitindo sensações desagradáveis quando os provamos; outros podem parecer demasiado planos, chatos, moles; outros ainda deixam sensações de frescura e leveza bem agradáveis. No centro de todas estas sensações positivas e negativas está uma das componentes fundamentais do vinho- a acidez - ou seja, o conteúdo do vinho em ácidos.
LEIA TAMBÉM: ProWine chega a Tóquio em abril e a São Paulo em outubro
A acidez está para o vinho como a água para a vida, pois dá-lhe forma, sabor, frescura e alma. A acidez faz parte da estrutura de um vinho e define o seu carácter, para além de lhe dar longevidade. A acidez personifica também a dinâmica de um vinho em prova. Um vinho com uma acidez adequada estimula a salivação e a concentração do provador.
Pelo contrário, um vinho demasiado ácido e azedo agride o palato do provador, ou um vinho pobre em acidez torna-se frouxo, pesado e desinteressante na prova. Daqui se depreende que o equilíbrio ácido num vinho é, como em tudo na vida, uma questão fundamental.
A natureza vegetal é rica em ácidos. Tártarico, málico e cítrico são os mais comuns. A Vitis vinifera, ou seja, a videira de vinho, é um caso especial. Contrariamente à maioria das plantas os seus frutos são pobres em ácido cítrico mas acumulam largas concentrações de ácido tartárico.
LEIA TAMBÉM: Produtores de vinho de Israel compram vinícola em Bordeaux
Por esta mesma razão, a acidez do vinho é medida em gr/litro de ácido tartárico.Assim sendo, a acidez dos vinhos provem majoritariamente do ácido tartárico e em menor grau do ácido málico (em particular nos vinhos brancos) contido nas uvas.
Mas mais importante que o seu conteúdo em ácidos é a força da acidez de um determinado vinho. Entre os vários elementos que compõem um ácido está o hidrogênio. Um ácido em solução perde parte do seu hidrogênio que se dissolve ficando no estado livre (hidrogênios). É esta quantidade de hidrogênio livre que dá força à acidez de um vinho. Quanto maior for a concentração de hidrogênios em solução mais firme é a acidez e menor o pH.
O que equivale dizer que o pH é, em termos enológicos, um dado mais importante que o conteúdo em ácidos. Assim é de fato. Um pH equilibrado, ou seja, entre 3.0 e 3.3 no caso de um branco e entre 3.4 e 3.6 no caso de um tinto (há exceções, evidentemente), não só melhora a prova de um vinho como também melhora a sua cor e o protege do ataque bacteriano indesejado.
+lidas
1000 Stories, história e vinho se unem na Califórnia
Vinho do Porto: qual é a diferença entre Ruby e Tawny?
Pós-Covid: conheça cinco formas para recuperar seu olfato e paladar enquanto se recupera
Os mais caros e desejados vinhos do mundo!
Notas de Rebeldia: Um brinde ao sonho e à superação no mundo do vinho